7 de novembro de 2004

Forte Apache - A verdade está aqui!

Marcelo Volcato

Forte Apache. O mais tradicional dos brinquedos, quando pensamos em soldadinhos de plástico. Desde os primeiros produzidos, no final dos anos 40, até os dias de hoje, são raríssimos os fabricantes de soldadinhos que não os fabricaram. De madeira, metal, papelão, ou plástico, as paliçadas de madeira são parte integrante de todo Forte Apache que se preze. Inconfundível, não é mesmo? Alguns, tentando serem originais, lhe deram um novo nome. Dependendo da criatividade de cada um, valia Forte Comanche, Forte Rin-Tin-Tin, Forte Sioux, Forte Arizona, Forte Grant, Forte Bowie, Forte isso, Forte aquilo, etc, etc, etc... Todos, na verdade, o mesmíssimo brinquedo. 

Forte Apache da Marx:



Em meados dos anos 50, mais de 80% dos meninos norte-americanos tinham um Forte ou outro entre seus brinquedos. Milhões de Fortes valentemente defendidos pela Sétima Cavalaria contra os selvagens Apaches. Nos anos 60 a febre chegou ao Brasil. Quase todos os meninos que conheci naquela época, tinham no mínimo um Forte, isso sem contar, aqueles que como eu, tiveram diversos Fortes (um no Natal, outro no aniversário, durante anos a fio...). Com todo esse sucesso, imagina-se que não existam dúvidas, ou inverdades à respeito do Forte Apache, certo? Errado. 

Por incrível que pareça, os erros e as inverdades são inúmeros. Vamos agora restabelecer a verdade histórica do Forte Apache. O da Gulliver? Não, aquele real, o do velho oeste! Faço isso, não para desafiar ou polemizar com ninguém. Mas colecionar brinquedos não deve servir de desculpa para reinventar a história. Alguns colecionadores, que não perderam seu tempo, como eu, estudando a fundo a história do velho oeste, poderão aprender muito. É esse o objetivo dessa coluna: Contar histórias que a maioria dos colecionadores desconhece, mas que valeria a pena conhecer. 

Criado pelo governo americano em 1870, no Arizona, para controlar os apaches na recém criada reserva White Mountain, o "Fort Apache" serviu de base para a oitava cavalaria, e mais tarde a décima, até 1922, ano em que os EUA desistiram de unidades de cavalaria montadas em cavalos. É isso mesmo que o amigo leu, a sétima cavalaria, do famoso coronel (e não general) Custer, não estava nem perto do Arizona nessa época. O Forte Apache foi um quartel de história pouco movimentada. Por exemplo: Ataque dos apaches? Apenas um nos longos 52 anos em que foi ocupado... No dia 1º de setembro 1881, um grupo de apaches atacou o forte incendiando os prédios mais afastados. Um tenente e um cavalo ficaram feridos. Evidentemente não passou de uma escaramuça sem importância, os apaches só queriam ocupar a cavalaria enquanto suas mulheres e crianças fugiam da reserva. Se ao menos o Forte Apache tivesse uma paliçada de madeira... Ele não tinha, lamentavelmente. O forte era simplesmente um agrupamento de prédios baixos, ao redor de uma praça onde a cavalaria marchava em paradas. Só isso! Nada de portão com nome em cima, paliçada de madeira, ou torres nos cantos! Esse modelo de forte ( paliçada de madeira, torres e portão ) existiu nos Estados Unidos, contudo nunca no Arizona, muito menos no final do século XIX, quando os Apaches causavam problemas para a cavalaria. O Forte William Henry da Guerra dos índios e dos franceses (por aqui chamada: Guerra dos sete anos), mostrado no filme "O Último dos Moicanos", era desse tipo. 

O curral no Forte Apache, a coisa mais parecida com uma paliçada

Ruínas dos alojamentos

Uma visão moderna do Forte Apache, ontem como hoje, nada de paliçadas

O prédio mais alto do Forte Apache, o alojamento do capitão

Mas, nas brincadeiras de criança, o grande chefe apache Gerônimo... Espere aí. Gerônimo nunca foi chefe! Sua posição na tribo era a de "medicine-man", o curandeiro, ou pajé de uma tribo. É isso mesmo. Cuidado quando vocês forem ao Arizona, pelo menos lá, eles conhecem a história de Gerônimo. Goyahkla ( seu nome verdadeiro - Gerônimo foi inventado pelos brancos que achavam o original impronunciável ), cuja tradução significa: "Aquele que boceja", não era chefe coisa nenhuma! Ele teve uma infância e adolescência pouco notável, sua tribo, os apaches Bedonkohe, constituíam uma das menores e menos expressivas tribos de toda a nação apache. Já adulto, após perder esposa e filhos para um grupo de mexicanos que os matou para roubar seus cavalos, Gerônimo procurou pelo chefe dos Chiricahua (essa sim uma tribo poderosa), o famoso Cochise, e juntou-se a eles. Eventualmente, após a morte de Cochise, Gerônimo comandaria bandos de apaches renegados, fugitivos das reservas por muitos anos, mas chefe de uma tribo apache, isso ele nunca foi. E antes que eu me esqueça: Apache não é o nome de uma tribo, como ficou claro no texto. Apache era o nome da nação, diversas tribos compunham, e ainda compõe, a nação apache. 

Mais alguma coisa? Sim! Lamentavelmente ainda preciso esclarecer mais três coisas:

1 - Confederados? Desde os tempos da Casablanca, a Gulliver insiste em chamar a 7ª Cavalaria de "Confederados". Isso está errado! Confederados foram os americanos do sul, que enfrentaram os do norte na Guerra de Secessão (1861-1865), ou Guerra Civil Americana. A 7ª cavalaria era ianque, ou seja, do norte!

2 - Apaches ou Sioux no Forte Apache? Infelizmente de todas as figuras de índios lançadas por Casablanca e Gulliver, nem uma única se parece com um apache. Tratam-se todos de índios da planície, como os Sioux, que foram os inimigos de Custer na batalha de Little Big Horn. O problema é que nunca os Sioux estiveram sequer no Arizona, quanto mais no Forte Apache.

3 - Cavalaria montada ou a pé? Pode parecer estranho, mas exceto quando atacavam aldeias com mulheres e crianças (o que eles fizeram às vezes), os soldados da Cavalaria lutavam a pé! O motivo? Ao contrário da lenda, a Cavalaria não tinha carabinas Winchester de repetição, mas carabinas Springfield de um único tiro. Ora, recarregar essa arma em um cavalo em movimento seria impossível! Em 99% das batalhas que travou contra os índios, a Cavalaria desmontou, e um em cada quatro soldados ficou segurando as rédeas dos cavalos (para que não fugissem com os tiros), enquanto os outros três lutavam. Incrível, mas verdadeiro.

A verdadeira aparência dos Apaches

Bem, agora sim, o amigo pode dizer que sabe tudo sobre os Fortes Apaches. Os de brinquedo, e o de verdade!

Um comentário:

  1. Quando criança, a gente não se preocupava em saber se aquele brinquedo tinha uma história. A criança cria sua própria história a partir de seus brinquedos, principalmente aquela criança que não teve um pai ou avô com tempo suficiente para conversar sobre aquele brinquedo. Talvez nem tivesse um pai ou avô naquele momento. Entretanto, hoje, saber dessa história é muito importante para os pais e avôs, principalmente para mim que estou construindo um para meu neto(4 anos) que, sem conhecer o brinquedo Forte Apache, já demonstra um certo interesse por conflitos entre invasores e invadidos. Esta brincadeira vai ensiná-lo as consequências desses conflitos. É o que eu pretendo passar para ele. Muito grato pelo material divulgado.

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